quinta-feira, 6 de agosto de 2009

FIM


Quando eu cheguei na Enfermaria de Pediatria, me avisaram que o Ricardinho estava morrendo. Esse garoto de 3 anos, lindo, tinha uma doença crônica e por essa razão estava internado ali no HC-UNICAMP. No dia anterior ele fora levado para a UTI porque a infecção que o acometera em um procedimento, estava tomando conta do seu frágil corpo.
A família já havia sido avisada e estava a caminho, mas como moram longe, iam demorar, diante disso decidí que eu não ia deixá-lo morrer sozinho, e por isso fui para lá. Mesmo sabendo que o Ricardinho estava sedado, fui para ficar ao lado dele.
A enfermeira entendeu e aprovou meu intento, permitiu minha presença, me ajudou a me instalar ao lado do berço, me pediu que anotasse a hora em que ele parasse e nos isolou com um biombo.
Por 2 horas e pouco ficamos a sós, eu e o Ricardinho.
O silêncio era gostoso e aconchegante.
Por trabalhar há muito tempo no hospital, eu sei ler os números mais básicos daqueles aparelhos da UTI, e os mesmos indicavam que o garoto estava cada vez mais fraquinho.
Algumas vezes eu falava baixinho com aquele meu amiguinho tão amado. Ele não me respondia como das outras vezes, mas nem precisava, pois eu só queria que ele soubesse que eu estava ali.
Muitas outras vezes eu falava baixinho com Deus. Ele também não me respondia, mas nem precisava, pois eu sabia que Ele estava ali.
O silêncio só foi quebrado quando um dos aparelhos emitiu baixinho um alarme contínuo. Era o fim.
Olhei para o relógio, desliguei o alarme, e fiquei mais um tempo ali, segurando a mãozinha dele, chorando.
“Jesus disse: Deixai os pequeninos, não os embaraceis de vir a mim, porque dos tais é o reino dos céus.” (Mateus 19:14)
O Ricardinho chegou lá no céu às 15:37 horas, pelo meu relógio.

3 comentários:

  1. Caríssimo Xyko,

    Que emocionante experiência a sua... fico pensando que infelizmente cada vez mais as pessoas morrem nos hospitais. Em Campinas as estatísticas mostram que 83% das mortes são nos hospitais, 14% nas cenas de acidentes e apenas 3% em casa. Houve uma progressiva hospitalização da morte no séc. XX. A morte, antes um fenômeno domiciliar e público, passou a um fenômeno hospitalar e privado...
    Hoje se esconde e se nega a morte! Desse modo cada vez mais temos óbitos como esse do Ricardinho, solitários, sem a presença dos familiares e amigos, nos frios leitos dos hospitais. É claro que sua presença amiga foi uma grande força e apoio para ele e mitigou bastante sua solidão, mas que pena que sua família não chegou a tempo...
    A Bioética hoje em dia luta pela humanização da morte, dar suporte para as famílias novamente acolherem a morte em suas casas. Não é fácil, mas devemos apoiar essa mentalidade, afinal talvez essa seja a morte que desejamos para nós mesmos... em casa, cercados pela família e amigos.
    Jesus sofreu progressivamente durante a sua Paixão e nos mostrou que o ápice desse sofrimento é a morte solitária... ("Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?" Mc 15, 34)
    Com certeza o Ricardinho está tranquilo agora, nos braços de Deus...
    E que Deus nos dê a todos o privilégio de uma morte serena!
    Os católicos rezam a Ave Maria que termina assim: "Santa Maria, Mãe de Deus, rogai por nós pecadores agora e na hora de nossa morte, Amém!"

    Com respeito, Paz

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  2. Meu 'desconhecido' amigo Xyko,
    Desde a muito acompanho seu blog e tenho sido edificado pelos textos postados aqui.
    Este em especial, tocou tanto o meu coração que tomei a liberdade de compartilhar com outros amigos.
    Louvo a Deus pela sua vida e por compartilhar conosco experiências tão preciosas.
    Que Deus o abençoe MUITO...
    nEle

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  3. Meu caro Ronaldo, que bom "conhecê-lo", fico realmente feliz ao saber que você tem nos acompanhado nessa caminhada que se chama BLOG. Meus textos são escritos para serem lidos, e sempre que quiser usá-los, sinta-se à vontade.
    Um abraço, Xyko.

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