sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

ZILDA ARNS, UMA HEROÍNA BRASILEIRA – Rui Motta 14/01/10

O Brasil é um país de poucos heróis sem chuteiras e, mesmo os grandes personagens dos episódios mais marcantes da história tiveram suas vidas transformadas ao sabor dos interesses oportunistas. Poucos brasileiros realmente conhecem com profundidade as ideias daqueles que foram os verdadeiros responsáveis pela construção de nossa identidade como nação, os que pavimentaram os caminhos democráticos trilhados pelas atuais gerações, os que sacrificaram as próprias vidas pelos outros.
Uma das maiores personalidades brasileiras de todos os tempos, a doutora Zilda Arns Neumann era uma dessas desconhecidas de muita gente, com uma história exemplar que a coloca no panteão de verdadeira heroína, pela alta abrangência, pela suprema importância e simplicidade de um trabalho desenvolvido ao longo de 40 anos. Fundadora e esteio da Pastoral da Criança e da Pastoral da Pessoa Idosa, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), foi incansável na luta contra a fome, a miséria, o abandono das crianças, dedicando todo o seu tempo a um programa exemplar.
Zilda Arns era o tipo de pessoa que fazia acontecer. Agia com determinação, estava sempre focada em seus objetivos, tinha um coração benemérito por natureza. Superava os obstáculos com firmeza e, na obviedade das soluções, conseguia resultados extraordinários onde outros se debatiam em burocracia e discursos improváveis. A criação nos anos 80 de uma rede de propagação de conceitos elementares de educação alimentar e saúde ostenta números impressionantes.
Sua formação médica e religiosa levou ao desenvolvimento de um programa que espalhou-se por todo o mundo como exemplo de combate efetivo e de baixo custo contra a fome. Seu discurso direto, prático e funcional se espalhou por 20 países. No Brasil, a sua rede de solidariedade é formada por 260 mil voluntários, acompanhando 1,9 milhão de gestantes e crianças menores de seis anos, além, de 1,4 milhão de famílias na faixa de extrema pobreza, em mais de 4 mil municípios. A dimensão do seu trabalho lhe valeu vários prêmios de reconhecimento internacional, além de três indicações para o Nobel da Paz.
Seu propósito foi alcançado justamente porque Zilda Arns não tinha a bandeira política em seu trabalho. Crítica dos programas assistencialistas do governo Lula, lamentava que o Fome Zero e seu sucessor, o Bolsa Família, não tinham a devida preocupação com os efeitos complementares do combate à miséria, como alterações na estrutura social, educação e qualificação profissional. Algo como ensinar a pescar...
Zilda Arns estava no Haiti justamente para mobilizar a base religiosa do país para desenvolver projeto com base em sua experiência bem sucedida. O mundo perdeu uma de suas heroínas, alguém que deixa um legado inestimável de fé, perseverança e confiança nas pessoas, a quem ela amou profundamente, a ponto de não ter passado por esta vida em vão.

Um comentário:

  1. Outro dia mesmo era assunto deste blog a passagem:

    "Combati o bom combate, terminei minha carreira, guardei a fé. Resta-me agora receber a coroa da justiça..." II Tim 4, 7-8

    Interessante que o nome Zilda, de origem germânica, significa combatente (hild) da vitória (sieg).

    Respeitosamente, paz,

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