segunda-feira, 17 de maio de 2010

A MISÉRIA E O AMOR

Era mais ou menos 2 e meia da tarde. Quando a Célia, secretária da Capelania do HC-UNICAMP, me falou que a Ester estava me esperando lá fora do escritório, no corredor, eu estranhei a ponto de não acreditar. Eu havia passado a tarde inteira do dia anterior com aquela menina de 14 anos e sua mãe, a Dona Sueli. Quando as deixei, lá por 5 e meia da tarde, elas só estavam esperando a condução da prefeitura da sua cidade (Cruzília, MG), para irem para casa. Elas nunca vieram dois dias seguidos para as consultas da Ester, pois a grande distância (314 Km, que a ambulância faz em 4 horas) entre Campinas e onde elas moram torna isso impossível. Por isso é que estranhei.
O que aconteceu foi o seguinte: a ambulância que trouxe os pacientes para consultas deixou as duas no HC e foi para São Paulo, capital, levar uma paciente para um hospital de lá. Quando ia voltar para a UNICAMP, o veículo quebrou e não teve como vir. Resumindo: as duas passaram a noite em um banco do lado de fora do hospital. Ligaram para Cruzília e a Assistente Social de lá disse que não havia outra viatura para buscá-las. Sem poder alimentar-se (estavam totalmente sem dinheiro), um frio fortíssimo (era junho) e sem o número do meu telefone. A Célia as alimentou e cuidou delas.
Muitos milhares de pessoas precisam cuidar da saúde e o único recurso que possuem é vir nesses veículos das prefeituras (muitos em péssimas condições de manutenção), chegar ao amanhecer ali no HC, ter a consulta e esperar até a noite para voltar para casa. Passam o dia inteiro ali na frente do hospital, muitas vezes sem comer, no frio, calor ou chuva. A maior parte deles são bem velhinhos ou crianças. E ainda dão graças a Deus por terem esse atendimento.
Conversando com essas pessoas é que ficamos sabendo que eles vivem, ou sobrevivem, numa pobreza enorme. Muitos na miséria. Meu coração por diversas vezes ficou apertado por ver crianças chorando ... de fome. Muitos dos males físicos que as levam ao hospital são decorrência de não ter o que comer.
Me preparei muito para estar ali no hospital e descobri que além do imprescindível preparo tenho que ter algo mais:
“Eu poderia falar todas as línguas que são faladas na terra e até no céu, mas, se não tivesse amor, as minhas palavras seriam como o som de um gongo ou como o barulho de um sino. Poderia ter o dom de anunciar mensagens de Deus, ter todo o conhecimento, entender todos os segredos e ter tanta fé, que até poderia tirar as montanhas do seu lugar, mas, se não tivesse amor, eu não seria nada. Poderia dar tudo o que tenho e até mesmo entregar o meu corpo para ser queimado, mas, se eu não tivesse amor, isso não me adiantaria nada.” (1 Coríntios 13:1-3 NTLH)

Um comentário:

  1. Caríssimo,

    Não deixo de ficar muito indignado com os políticos, principalmente os do interior de Minas Gerais (o povo do sul de Minas vem todo tratar na UNICAMP, superlotando o serviço, porque não tem outra alternativa em sua terra), que vão se acomodando e não investem em saúde nos seus respectivos estados e cidades, já que as pessoas se desdobram e se viram para serem tratadas nos "grandes centros"...
    Para esses políticos (ao invés de construir postos de saúde e hospitais, o que é o seu dever) investir em saúde é comprar ambulâncias e fazer festa no dia da entrega... depois, nem manutenção dessas mesmas ambulâncias interessa mais, como no caso que você citou.
    Pior é o sofrimento dessas pobres pessoas...
    A indignação deve nos fazer lutar por um Brasil mais humano e solidário...


    Apesar de tudo, Paz,

    ResponderExcluir