Aquele foi realmente um dia muito especial. Eu era bem jovem ainda quando fui convidado para participar de uma reunião de oração com um grupo de pessoas que não conhecia. Alguns amigos se prontificaram a me acompanhar, e assim lá fomos nós. Porém, havia um detalhe: eu não sabia exatamente em que local o tal grupo se reunia para orar, só sabia qual era o bairro. Mas decidimos seguir em frente assim mesmo! Quando chegamos a uma determinada rua do bairro, paramos o "carro" (nessa época, meu “carro” era uma perua Kombi caindo aos pedaços) e decidimos orar, pedindo a orientação de Deus. Assim que abrimos os olhos, vimos alguns rapazes, carregando suas Bíblias, passando bem à nossa frente.
— Vamos seguí-los? —, sugeri.
— Vamos — eles concordaram.
Em poucos minutos estávamos no local onde se daria a tal reunião!
Logo que entramos, percebemos que aquele era um grupo bem animado. Todos cantavam e louvavam a Deus com entusiasmo. Terminado o período de louvor, uma senhora se levantou, trazendo uma boa mensagem bíblica para todos os presentes, e em seguida, vieram as orações. Eu nunca havia participado de uma reunião de oração com um grupo pentecostal, e quando as orações terminaram, estava ainda um pouco assustado com tudo aquilo, sem saber o que pensar. Foi quando um rapaz se aproximou de mim e disse:
— Enquanto orávamos, Deus me falou, através de uma visão, que esta noite você vai ser curado e poderá andar.
Não preciso dizer que saímos dali mais perdidos do que quando chegamos. Todos os meus amigos queriam ficar ao meu lado para presenciar o milagre. Fomos até uma praça e resolvemos ficar ali orando e esperando... Já de madrugada, alguns policiais se aproximaram de nós querendo saber o que estávamos fazendo na rua àquela hora. Alguém que morava nas imediações deve ter achado bastante suspeito aquele grupo de rapazes passando a noite na praça e resolveu chamar a polícia. Depois de nos revistar, os guardas nos mandaram ir para casa dormir, o que nós obedecemos prontamente. Na manhã seguinte, todos os meus amigos telefonaram para saber o que havia acontecido. Conversei com cada um, sentado em minha cadeira de rodas (onde estou até hoje).
Várias coisas passaram pela minha cabeça naquele dia. A primeira delas foi: será que eu não tenho fé suficiente? Mas eu sabia que isso não era verdade. A seguir, pensei: Será que o rapaz que teve a visão não se enganou quanto ao dia? Mas se ele se enganou nesse ponto, então pode ter se enganado no resto! As dúvidas invadiram a minha mente: Por que Deus não falou diretamente comigo? Será que Deus realmente falou com aquele rapaz?
Durante todos esses anos de trabalho na Capelania do HC-UNICAMP tenho visto muitas pessoas em situações semelhantes a essa. Já vi pessoas orarem a Deus e serem curadas. Mas também já vi pessoas orarem a Deus e NÃO serem curadas! E aí? Como explicar?
Quero falar (“de cátedra”) sobre esse assunto, mais especificamente sobre a questão "E QUANDO DEUS NÃO CURA?"
Não me lembro bem de qual era a doença daquele rapaz, mas lembro que os rins já não funcionavam e ele estava extremamente inchado. Havia muitos líquidos acumulados em seu organismo. Já fazia algum tempo que ele estava internado, e sua mãe ficava o tempo todo ao lado dele. Ambos eram evangélicos, membros de uma igreja pentecostal.
Numa determinada tarde, a mãe compartilhou comigo que havia passado por uma “experiência espiritual” na noite anterior. Ela passou a me explicar o que havia acontecido:
— Ontem à noite, depois que meu filho finalmente conseguiu dormir um pouco, deixei-o por alguns minutos para ir tomar banho. Enquanto me preparava para entrar no chuveiro, o desespero tomou conta de mim. Ajoelhei-me ali mesmo, do jeito que estava, e comecei a orar, esquecendo-me do desrespeito que estava cometendo ao me dirigir ao Senhor sem roupas, tamanha era minha dor ao ver meu filho definhando. Orei e supliquei ao Senhor com tanta fé para que Ele curasse meu filho, que DEUS ME OUVIU! Enquanto orava, Deus me falou que meu filho vai ser curado e depois vai testemunhar nas igrejas aquilo que Deus fez em sua vida!
No dia seguinte, porém, seu filho morreu.
Ao saber da morte do rapaz eu me lembrei da frase de M. L. Jones: “Não devemos ter fé na nossa fé, mas sim no Deus da nossa fé”.
Creio que Deus pode curar de três formas:
A cura pode vir de “fora”, ou seja, Deus pode usar médicos, remédios ou tratamentos para nos curar. A cura também pode vir de “dentro”, isto é, Deus pode nos dar ânimo, tranqüilidade, esperança. Certa vez, ouvi de um médico, diretor do departamento de radioterapia do HC-UNICAMP, que aquilo que estávamos fazendo pelos pacientes representava 60% do processo de cura (naquele dia, um coral havia se apresentado para os doentes do ambulatório). Mencionei esse fato ao fazer uma palestra ali no hospital, e uma psicóloga pediu um aparte para comentar que, dependendo do caso, essa porcentagem chega a 80%!!! Por fim, a cura pode vir por meios “sobrenaturais”, ou seja, através de um milagre. É importante frisar que nem sempre Deus cura a doença da pessoa, mas Ele sempre cura a pessoa.
Mas, Deus pode também NÃO curar.
Agora, leia Romanos 8.28 “Sabemos que todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito”. Antes de nos aprofundarmos na interpretação desse versículo, gostaria que você refletisse na seguinte questão: a cura é sempre um bem?
Continuemos então.
Eu me preparava para visitar uma paciente internada no HC-UNICAMP, uma garota de 16 anos que havia sofrido uma lesão na coluna ao cair de uma árvore. Os médicos haviam diagnosticado que ela ficaria paralítica para o resto da vida, pois a lesão era irreversível. Antes de entrar no quarto, pensei: o que falar diante de tal situação? Haviam me informado que alguns parentes da garota haviam juntado seus recursos para dar a ela uma cadeira de rodas, mas quando a levaram para a menina, assim que ela pôs os olhos na cadeira, cobriu o rosto com o travesseiro e começou a chorar convulsivamente.
A forma como ela me recebeu também não foi das mais amistosas. O fato de eu usar uma cadeira de rodas talvez tenha contribuído para que ela se mostrasse fria e lacônica em suas respostas.
Mas, não desanimei. A partir desse dia, passei a visitá-la, mesmo que rapidamente, todos os dias. Com isso, conquistei sua confiança, a ponto de ela me mostrar a página de seu diário onde estava registrado o acidente e todos os acontecimentos que vieram em seguida. Ao ler o que estava escrito ali, levei um choque. Ela havia registrado que quando caiu da árvore e não conseguiu se levantar, sua mãe chamou seu irmão para ajudá-la. Os dois a levaram no colo até o banheiro, deram-lhe um banho e só depois é que a levaram para o hospital. Mais tarde, o médico disse a ela que se eles a tivessem imobilizado imediatamente e chamado a ambulância de resgate, ela não teria ficado paralítica!! Assim, além de precisar se adaptar à nova situação, ela precisava também aprender a lidar com o conceito do perdão.
Depois de algum tempo, ela teve alta do Hospital e não tivemos mais notícias. Até que um dia nos encontramos casualmente em um dos ambulatórios. Começamos a conversar e ela me contou que estava rescrevendo seu diário, eliminando todas as partes tristes. Uma voluntária que me acompanhava naquele dia concordou plenamente, mas eu não. Quando ela me perguntou por que eu discordava, respondi: “O que seria dos grandes navegadores se nunca tivessem que enfrentar tempestades?” Ela voltou atrás e manteve o registro das partes tristes. O sofrimento e a dor é que poderão transformá-la em uma pessoa especial! Em tempo, pudemos falar de Jesus Cristo para ela durante a sua internação e sua resposta foi altamente positiva.
Sabemos que todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito. (Romanos 8. 28)
De que forma o fato de uma doença não ser curada pode contribuir para o bem de uma pessoa?
Eu creio realmente que “todas as coisas [todas mesmo] cooperam para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles quem são chamados segundo o seu propósito”. A questão é que nem sempre desejamos ou consideramos bem-vindo o “bem” que Deus tem para nós. Por exemplo, não desejamos passar por uma doença, mas através dela podemos desenvolver um espírito de paciência e gratidão por aqueles que cuidam de nós. Muitas vezes uma doença nos permite reconhecer nossa dependência de Deus e pode nos levar a uma vida de oração. Passamos também a dar maior valor à vida e à saúde, além de muitas outras coisas advindas da doença. A mesma coisa acontece quando perdemos um emprego. Achamos que o bem seria conseguir rapidamente um emprego melhor, e não conseguimos enxergar que muitas vezes um longo período de desemprego é o melhor para nós. E assim com todas as outras aflições que podem nos atingir.
Você crê nisso?
Caro Xyko,
ResponderExcluirQue experiências fortes...
Fico pensando que nosso conceito de saúde nem sempre é o que Deus, no seu misterioso Amor por nós, tem nos reservado...
Saúde vem da palavra latina "salus", que significa salvação.
Para o cristão o conceito de salvação deve transcender esta vida. Nossa Esperança é para o além, para a consumação de nossa vida e nossa ressureição em Cristo. Jesus curou e até "reanimou" pessoas durante sua vida, mas todas elas morreram na Esperança da Ressurreição. A morte não se cura e morremos um pouquinho a cada dia...
Pode até ser fácil entender isso tudo, o difícil é aceitar os desígnos de Deus em nossa vida... difícil mesmo. Essa finitude, da qual temos consciência e nos traz sofrimento é que se chama de condição humana. O cristão é desafiado a superá-la...
Não é fácil...
Paz,
o psicologico das pessoas influenciam no funcionamento do corpo
ResponderExcluirnao confunda isso com um milagre