Texto de Osmar Ludovico
A audição é um sentido maravilhoso. Somos gratos a Deus por esse dom, pena que o usemos tão mal. Vivemos imersos no ativismo, na agitação, na correria. Somos falastrões compulsivos. Buscamos nos cercar de muitos ruídos e estímulos, com medo da sensação de abandono. Há pouco espaço para o silêncio nas igrejas e casas. Nossa capacidade de escuta é afetada por esse constante barulho ao redor. A verdadeira e profunda escuta emerge de um coração quieto e sereno. Quanto mais tagarelice e barulho, menos podemos ouvir.
A quem devemos ouvir? Em primeiro lugar, à voz de Deus. Esse é um tema constante nas Escrituras, que descrevem a dureza de coração como a incapacidade de ouvir a Palavra. É preciso ouvir Deus com a mente e o coração, com a razão e os sentimentos, deixando-se penetrar pela Palavra transformadora.
Como a semente que cai no solo para ser fertilizada e dar fruto, assim é a Palavra de Deus que cai no coração. “Terra” em latim é húmus, o que deu origem à palavra “humildade”. Assim, ela permanece quieta, sem chamar a atenção, pisada, despercebida, mas está pronta para acolher a semente no profundo, no escuro, e dar seu fruto no devido tempo.
Quando foi a última vez que escolhemos acolher a Palavra e, como Maria, nos colocarmos silenciosamente aos pés de Cristo para ouvi-lo? A capacidade de ouvir Deus está relacionada à qualidade da vida devocional. Ler a Palavra, recebê-la e aplicá-la no cotidiano é graça, favor imerecido, e, ao mesmo tempo, disciplina a ser desenvolvida. Graça, pois, depende da revelação de Deus e não pode se tornar uma técnica; disciplina, pois requer de nós uma escolha, um exercício no tempo (horário pré-determinado) e no espaço (local propício).
Em segundo lugar, devemos ouvir uns aos outros. A comunhão depende de comunicação. Ouvir e ser ouvido cria a comunidade. Os litígios e conflitos surgem quando não ouço e não sou ouvido. Os relacionamentos desmoronam por causa da incapacidade de se escutar uns aos outros. Essa é a queixa comum na família, partindo de esposas, maridos e filhos: “Não sou ouvido, não sou compreendido, não sou respeitado”.
Ouvir negligentemente gera mal-entendido. Em vez de acolher, debatemos, em vez de ouvir, discutimos. Alteramos o tom de voz, gritamos. Enquanto o outro fala, pensamos na resposta, e uma conversa vira bate-boca. Reconciliar e pacificar significa levar duas pessoas a ouvir uma à outra. Quando realmente ouvimos aquilo que o outro diz, nos identificamos com sua humanidade; passamos a entender seu mundo e, assim, podemos chorar com os que choram e nos alegrar com os que se alegram.
Quando há escuta, podemos nos expor, contar quem somos na certeza de que o outro nos ouve e se solidariza conosco. A controvérsia teológica e a maledicência revelam mentes estereotipadas, fechadas, avessas ao diálogo e à transparência, além do medo da aproximação, que dificulta discernir a fraternidade, isto é, encontrar o irmão e perceber que somos membros do mesmo corpo. Quando existe um contexto de escuta, as máscaras caem. Ouvimos e somos ouvidos a partir de nossa realidade mais profunda e aprendemos a nos respeitar, validando e considerando a história e a singularidade das pessoas.
Finalmente, somos chamados a ouvir o mundo. Devemos começar reconhecendo que nós, cristãos, vivemos alienados numa bolha protetora. Não ouvimos o clamor do mundo – pelo contrário, ouvimos passivamente a mídia com sua mensagem consumista que nos acomoda e anestesia. Tornamo-nos surdos aos inúmeros clamores do mundo.
Só quando ouvimos, entramos em contato com o mundo tal qual ele é. Assim, nos identificamos e compreendemos o drama do ser humano sem Deus, ouvimos suas indagações, suas dores, e então, podemos falar de um evangelho que vai ao encontro de suas necessidades. Esse é o princípio da encarnação. Ouvimos não somente o clamor dos perdidos, mas também o clamor dos pobres. Só há um ser que devemos nos recusar a ouvir: o diabo. Esse foi o erro de Adão e Eva: em vez de ouvirem a Deus, ouviram Satanás.
Por fim, é necessário cumprir o grande mandamento: “Ame o Senhor, o seu Deus, de todo o seu coração, de toda a sua alma, de todo o seu entendimento e de todas as suas forças. [...] Ame o seu próximo como a si mesmo” (Mc 12. 30-31); precisamos aprender a ouvir melhor a Deus e uns aos outros, pois essa é uma profunda expressão do amor.
Fala Xyko!!
ResponderExcluirPuxa, como é dificil eu me aquietar.. mesmo quando, estou quieto em meu canto.. existem tantas questões, tantas preocupações, tantas segundas intenções de meu coração orgulhoso.
Posso até ficar por muito tempo em silencio, e nem por isso aquietar... e mortificar tudo aquilo que pertence a mim para ouvi-lo.
só por hoje, ;)
abração Xyko